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quinta-feira, 19 de junho de 2008

Ser professor... no Nordeste e não só!



Raia mais uma manhã na Vila do Nordeste. Avizinha-se mais um dia estrénuo de aulas. Não seria nada do outro mundo se o processo de ensino/aprendizagem se limitasse a isso mesmo... Todavia, quem trabalha no ensino sabe muito bem que não é assim. Na verdade, a planificação das respectivas aulas – que é feita na noite anterior, muitas vezes pela noite fora – enfrenta diversas dificuldades na sua concretização: falta de material diverso; salas com poucas condições; biblioteca mal apetrechada; parcos meios informáticos disponíveis; recursos humanos exíguos; isolamento evidente da localidade; contexto sócio-cultural complicado entre outras coisas…
Apesar de tudo isso, todos os do­centes e funcionários deste estabele­cimento de ensino dão o seu melhor em prol dos principais interessados: os alunos do concelho do Nordeste. Quantas vezes, já altas horas da noite, cabeceando com sono, se continua a corrigir trabalhos e testes e a preparar material pedagógico - didáctico de modo a enriquecer a componente lec­tiva? Quantas vezes se adquire material diverso com o próprio dinheiro para, por exemplo, imprimir os documentos adequados porque a escola não possui tinteiros? Quantas vezes se abdica do tempo livre porque determinado aluno precisa de apoio necessário à sua aprendizagem? Quantas vezes a família não é relegada para segundo plano para que se possa levar a cabo um trabalho adequado junto dos alunos? Quantas vezes a distância mão é venci­da pelos docentes desta casa para que os nossos alunos possam desenvolver as suas competências? E valerá a pena todo esse trabalho? Alguém agradece? De facto, num momento em que os pais, devido aos seus compromissos profissionais, e a sociedade em geral necessitam tanto dos professores para que os seus filhos possam permanecer na escola ao longo do dia, é curioso ve­rificar a forma ultrajante como alguns pais e filhos e a própria tutela tratam seres humanos qualificados dispostos a tudo pelos mais jovens, alguns des­tes cada vez mais esquecidos por uma família cada vez mais alheia aos seus deveres educativos.
Assim sendo, por que razão não se limitará o professor a arrumar a sua mala pejada de livros e papéis num canto do seu quarto e a improvisar no dia seguinte? Por que motivo insiste em planificar descritivamente todas as suas aulas, se não apreciam o seu trabalho? Se não o apoiam? Se não o respeitam? Se depreciam de todas as maneiras e feitios o seu labor diário? Se o pretendem avaliar da forma mais indigna, injusta e humilhante e quando essa avaliação, nos moldes definidos, não resultará em nada? Na verdade, apesar desta falta de respeito pelos pro­fissionais que trabalham com aqueles que serão as mais-valias num futuro próximo, tudo é feito pelos alunos.
É de realçar, também, que os discentes dos nossos dias são muito mais exigentes do que nós o éramos quando estudantes. Realmente, quan­do passámos pelos bancos da escola, não nos atrevíamos a criticar sequer, mesmo que alguma coisa não estivesse tão bem, com medo de represálias. Actualmente já nada é assim! Antiga­mente, como sabemos, os professores exigiam que os alunos trabalhassem afincadamente, sofrendo estes, não raras vezes, agressões físicas e psico­lógicas. E ainda assim os relembramos com amor e carinho e os saudamos quando passam na rua. Até nos rimos das nossas diabruras e dos castigos que nos eram infligidos pelos docentes da época! Hoje em dia são os próprios alunos que exigem ao professor que se entregue de corpo e alma às respectivas turmas, sendo castigado psicologica­mente e, por vezes, até fisicamente, pretendendo-se que o docente (hoje mero funcionário) seja avaliado, por exemplo, pelas classificações obtidas pelos alunos! Nesta linha, não nos podemos esquecer que, mais grave do que reter um aluno porque não desen­volveu as competências em momento oportuno, é ratificar inadequadamente a sua avaliação, possibilitando a sua transição para o ano lectivo seguinte sem ter desenvolvido as respectivas competências disciplinares.
Ainda assim, desprezados pela tutela e por uma boa parte dos encarre­gados de educação, com pouquíssimas condições que permitam a execução de um trabalho didáctico de acordo com as exigências da sociedade actual, todos os docentes que trabalham nesta terra sopram a plenos pulmões as velas das competências dos alunos para que estes possam alcançar horizontes longínquos no mar da nossa sociedade cada vez mais revolto!
Concluindo, esperemos, fervorosa­mente, que amanhã o sol raie rutilante e esplendoroso não só no Nordeste, mas em todo o país!

Adelino Martins
Professor




in Correio dos Açores, 19 de Junho de 2008.

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